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A importância da pesquisa translacional na busca pela cura do HIV

Atualizado em 13/11/2025 às 16:11, por Jaqueline Falcão.

médico

Dr. Ricardo Sobhie Diaz

Por Dr. Ricardo Sobhie Diaz, MD, PhD

 

A história da luta contra o HIV é também a história da evolução da ciência biomédica. Desde o isolamento do vírus nos anos 1980 até a atual era da terapia antirretroviral combinada (TARV), avançamos de forma extraordinária no controle da infecção. No entanto, apesar de toda a eficácia dos medicamentos disponíveis, ainda não conseguimos eliminar o vírus do organismo. O desafio que persiste é o reservatório viral: um conjunto de células infectadas de forma latente, onde o HIV permanece silencioso, resistente à ação dos antirretrovirais e do sistema imunológico.

 

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Nos últimos anos, diversas estratégias vêm sendo testadas para reduzir ou eliminar esses reservatórios. É nesse contexto que se insere o estudo que conduzimos na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em colaboração com instituições nacionais e internacionais, recentemente publicado no The Journal of Infectious Diseases. Trata-se de um ensaio clínico pioneiro que combina múltiplas intervenções terapêuticas em pessoas vivendo com HIV sob tratamento antirretroviral estável.

 

O objetivo foi avaliar a segurança e o impacto de uma abordagem integrada: intensificação da terapia antirretroviral com novas combinações, uso de nicotinamida (vitamina B3) e auranofina (fármaco originalmente utilizado em doenças reumáticas) e uma imunoterapia personalizada com células dendríticas produzidas a partir do próprio paciente.

 

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Os resultados trouxeram sinais concretos de avanço. Três participantes apresentaram controle viral prolongado após interromper a medicação, um deles por mais de 80 semanas. Em dois casos, a carga viral manteve-se consistentemente abaixo de mil cópias/mL por mais de cinco meses, sem qualquer sinal de comprometimento imunológico. Observamos ainda indícios de rejuvenescimento imunológico, um fenômeno biológico potencialmente relacionado à modulação inflamatória promovida pelas terapias combinadas.

 

Embora ainda seja um estudo de prova de conceito, o trabalho reforça a relevância da pesquisa translacional em HIV. A integração entre imunologia, virologia, farmacologia e biotecnologia é fundamental para transformar achados laboratoriais em intervenções clínicas seguras e eficazes. E, mais do que isso, demonstra que o Brasil tem competência científica para contribuir de maneira significativa na fronteira global da cura do HIV.

 

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A experiência adquirida nesse projeto, desenvolvido com o apoio da Fapesp, do CNPq e em parceria com o Weill Cornell Medicine (EUA) e o Instituto Italiano de Saúde, mostra que os ensaios clínicos complexos podem, e devem, ser realizados em centros de pesquisa latino-americanos. Isso é essencial para garantir que soluções terapêuticas futuras sejam viáveis, escaláveis e adequadas à realidade dos países onde a epidemia ainda é um grave problema de saúde pública.

 

Buscar a cura do HIV é mais do que um desafio científico; é um compromisso ético com as mais de 38 milhões de pessoas que vivem com o vírus no mundo. Os resultados que obtivemos são apenas o início de um novo ciclo de investigações, que continuará explorando como combinar segurança, eficácia e acessibilidade.

 

Se há algo que este estudo confirma, é que a ciência brasileira tem papel ativo nessa jornada, e que a cura do HIV, embora complexa, está cada vez mais próxima de deixar o campo das possibilidades para entrar no campo das realizações.

 

Sobre Dr. Ricardo Sobhie Diaz


Dr. Ricardo Sobhie Diaz é médico infectologista e pesquisador à frente do Laboratório de Retrovirologia da Divisão de Doenças Infecciosas da Escola Paulista de Medicina, na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Com formação em medicina (MD) e doutorado (Ph.D.), sua trajetória acadêmica e científica é marcada por contribuições pioneiras no campo da virologia, especialmente no estudo do HIV.

Reconhecido internacionalmente, o Dr. Diaz coordena estudos clínicos de alta complexidade voltados à cura funcional do HIV, explorando abordagens inovadoras que combinam auranofina, nicotinamida e imunoterapia com células dendríticas. Seu trabalho mais recente, publicado no Journal of Infectious Diseases, apresentou resultados inéditos: pacientes com HIV conseguiram manter carga viral indetectável por mais de 80 semanas sem uso de antirretrovirais, fora do contexto de transplante de medula óssea.

Além de seu papel como pesquisador, o Dr. Diaz atua como professor e orientador na Unifesp, contribuindo para a formação de novos cientistas e médicos. Seu laboratório é referência na América Latina em estudos sobre latência viral, reservatórios do HIV e estratégias terapêuticas combinatórias.

Com uma carreira dedicada à ciência translacional e ao impacto social da pesquisa, Ricardo Sobhie Diaz representa a vanguarda da infectologia brasileira, colocando o país no centro das discussões globais sobre o futuro do tratamento e da cura do HIV.